Embora Trump tenha deixado bastante claro que
vai continuar recorrendo à Justiça para questionar o resultado do pleito, Biden
ocupará o cargo político mais importante do mundo e, por isso, seu projeto de
governo é alvo de atenção internacional
BAURU, SP (FOLHAPRESS) - Depois de uma eleição
marcada por polêmicas, discursos inflamados e ameaças judiciais, Joe Biden
derrotou o atual ocupante da Casa Branca, Donald Trump, e foi declarado o 46º
presidente dos EUA.
Embora Trump tenha deixado bastante claro que vai
continuar recorrendo à Justiça para questionar o resultado do pleito, Biden
ocupará o cargo político mais importante do mundo e, por isso, seu projeto de
governo é alvo de atenção internacional.
O que pensa o presidente eleito sobre temas como
economia, meio ambiente e desigualdade racial?
Como serão as políticas do democrata para imigração
e a relação com o Brasil? O que Biden fará para tentar reerguer os Estados
Unidos após o país ter ocupado, com folga, o topo da lista no número de mortos
pela pandemia de coronavírus?
ECONOMIA
Mais de 11 milhões de pessoas estão sem trabalho
nos EUA, número que equivale a uma taxa de desemprego de 6,9%, de acordo com
dados oficiais divulgados nesta sexta-feira (6).
Grande parte desse número é efeito da pandemia de coronavírus, que arrastou o
país para a pior crise econômica de sua história desde a Grande Depressão.
Antes da Covid-19, os americanos viviam um bom momento econômico, e Trump dava
sinais de que tentaria usar a fase de bonança como trunfo político. Com a
mudança de cenário, os eleitores desviaram o foco para outros temas,
especialmente a crise sanitária.
A estratégia de Biden para reerguer a economia está refletida em seu slogan de
campanha -"build back better", algo como "reconstruir
melhor". Em seu conjunto de propostas, o democrata afirma que não pode
resolver a crise nos empregos sem resolver a crise na saúde. "Trump pode
ter esquecido a Covid, mas a Covid não nos esqueceu", diz.
Entre suas promessas, o presidente eleito lista
incentivos à inovação e à engenhosidade dos americanos como caminhos para
construir "uma infraestrutura moderna" e um "futuro de energia
limpa".
O democrata também propõe ajudar pequenos empreendedores ao mesmo tempo em que
"exige mais" de grandes corporações –o plano é reverter benefícios
fiscais concedidos por Trump a grandes empresários.
Segundo o plano de Biden, a agenda racial também precisa estar no centro das
questões econômicas e ser "uma prioridade por si só". Como
presidente, diz que vai expandir os investimentos em empresários e comunidades
negros, latinos e indígenas.COVID-19
Até este sábado (7), os EUA somavam mais de 9,7 milhões de casos e 236 mil
mortes causadas pelo coronavírus. E a crise parece longe de acabar, já que a
curva de casos diários voltou a crescer –nesta sexta, foram confirmadas mais de
126 mil novas infecções, segundo a Universidade Johns Hopkins.
A pandemia, inclusive, custou a reeleição a Trump, que minimizou
intencionalmente a gravidade da crise e contrariou em inúmeras ocasiões
orientações dos especialistas, mesmo após ele mesmo ser infectado.
Embora o cenário pandêmico ainda seja preocupante entre os americanos, Biden
promete escutar a ciência, garantir que as decisões de saúde pública sejam
tomadas por quem entende do assunto e restaurar a transparência do governo.
O plano do presidente eleito para o enfrentamento à Covid-19 tem sete
princípios básicos, que envolvem, entre outros tópicos, ampliação de programas
de testes e rastreamento, definição de diretrizes baseadas em evidências, distribuição
equitativa de tratamentos e vacinas e uma ordem nacional, por meio de alianças
com governadores e prefeitos, que tornaria obrigatório o uso de máscaras nos
EUA.
Biden também deve reverter a decisão de Trump de
retirar o país da lista de membros da Organização Mundial da Saúde (OMS).
"Os americanos estão mais seguros quando os Estados Unidos se comprometem
a fortalecer a saúde global. No meu primeiro dia como presidente, voltarei à
OMS e restaurarei nossa liderança no cenário mundial."
SAÚDE
A principal bandeira do novo governo na saúde pública é uma conquista do
governo de Barack Obama, de quem Biden foi vice durante dois mandatos. O
Affordable Care Act instituiu, em 2010, o programa que ficou conhecido como
Obamacare, responsável por ampliar a cobertura de saúde para pessoas que nunca
tiveram seguro no país em que não existe uma política nacional de saúde
gratuita, como o SUS brasileiro.
Desde a aprovação, entretanto, congressistas republicanos –e Trump, mais
recentemente– tentam revogar o Obamacare. Na próxima terça-feira (10), a
Suprema Corte dos EUA deve votar sobre a constitucionalidade de alguns trechos
da lei que o instituiu.
Como presidente, Biden promete não apenas manter o programa, mas estendê-lo a
um número ainda maior de americanos –estima-se que mais de 100 milhões de
pessoas tenham sido beneficiadas.
O democrata também fala em auxílios financeiros para ajudar famílias de baixa
renda a quitar despesas médicas, regulamentação de preços na indústria
farmacêutica e políticas antitruste para impedir a formação de cartéis entre as
empresas do segmento.
Em outra medida que deve encontrar resistência entre as alas mais conservadoras
da política americana, estão os planos de ampliação do acesso a métodos
contraceptivos e a proteção do direito ao aborto. Nos EUA, a legislação sobre
direito reprodutivo varia entre os estados, mas mesmo nos locais onde o aborto
é permitido, mulheres que optam pelo procedimento ainda enfrentam resistência.
EQUIDADE RACIAL
A corrida pela Casa Branca ocorre em um ano em que os EUA foram marcados por
uma onda de protestos contra o racismo.
Embora o gatilho para as manifestações tenha sido o
assassinato de George Floyd, um episódio terrível do histórico de violência
policial contra negros, os atos ganharam novas pautas, expuseram a desigualdade
racial como um problema estrutural dos EUA e, como era de se esperar,
alcançaram a disputa entre Biden e Trump.
O contexto foi decisivo, inclusive, para a formação da chapa democrata, visto
que o partido escolheu Kamala Harris, uma mulher negra, para ser vice de Biden
–também como uma tentativa de conquistar o voto de mulheres e negros, fatia
importante do eleitorado.
Apesar de serem minoria, negros americanos morrem mais em ações policiais, têm
renda menor, aparecem em maior proporção entre os desempregados e a população
carcerária e também são vítimas mais frequentes da Covid-19.
Biden, que foi vice do primeiro presidente negro da história do país, promete
tratar como prioridade a agenda dedicada a lidar com "os custos trágicos
do racismo estrutural".
Segundo seu plano de governo, isso significa, entre outras medidas, tratar a
desigualdade em suas raízes por meio do aumento de investimentos em programas
de empreendedorismo negro, moradia popular, acesso a educação superior e
infraestrutura de comunidades tradicionalmente negras.
IMIGRANTES E REFUGIADOS
Em poucos aspectos a diferença entre as abordagens de Biden e Trump fica tão
evidente quanto nas políticas direcionadas a imigrantes e refugiados.
Enquanto o republicano se fez notório por um forte discurso nacionalista, pela
promessa de construção de um muro na fronteira com o México e pelas tragédias
humanas como as vividas pelas famílias de imigrantes que foram separadas de
seus filhos, o democrata fala da imigração como essencial para a formação da
identidade dos EUA e como "fonte irrefutável da nossa força".
Dentro dos primeiros cem dias de governo, Biden promete unir as famílias que
foram separadas, redirecionar recursos da construção de muros nas fronteiras
para serviços de fiscalização e infraestrutura nos postos de controle e
suspender o veto a imigrantes de países de maioria muçulmana, ato que define
como "moralmente errado" e sem evidências de aumento de segurança
para os americanos.
Em 1980, Biden foi um dos senadores responsáveis pela aprovação da lei que
estabeleceu a política americana de recepção de refugiados. Entre outras
propostas, promete aumentar o teto anual –número máximo de indivíduos que podem
se refugiar nos EUA– das atuais 18 mil para 125 mil pessoas.
Pesa contra o democrata, entretanto, o fato de que, durante seu mandato como
vice-presidente, o governo americano bateu recordes de deportação, com centenas
de milhares de estrangeiros expulsos do país.
Em entrevistas durante a campanha deste ano, Biden admitiu que a administração
Obama cometeu "um grande erro" nas políticas de imigração. No último
debate, foi questionado sobre esse ponto por Trump.
"Quem construiu as gaiolas, Joe?", questionou o republicano, em
referência às condições desumanas em que imigrantes foram aprisionados em
centros de detenção construídos pelo governo Obama. Na ocasião, Biden procurou
se distanciar de seu antigo companheiro de chapa. "Serei presidente, não
vice-presidente."
MEIO AMBIENTE
Na última quarta-feira (4), os EUA deixaram, oficialmente, o Acordo de Paris.
Foi uma decisão tomada por Trump há três anos porque, segundo ele, as condições
do tratado, que busca formas de frear as mudanças climáticas no mundo todo,
eram prejudiciais à economia americana.
Além de prometer a volta dos EUA ao acordo internacional no primeiro dia de seu
governo, Biden tem um "plano para a revolução de energia limpa e justiça
ambiental". Em seu projeto, afirma que o país "precisa abraçar com
urgência esse desafio" e entender que "meio ambiente e economia estão
completa e totalmente conectados".
Entre outras propostas, Biden diz que, também no primeiro dia na Casa Branca,
vai assinar uma série de decretos "sem precedentes" para se
certificar de que os EUA alcancem uma economia de energia 100% limpa e zerem as
emissões de carbono até 2050.
O democrata também promete usar a política externa "para fazer com que
todos os países desenvolvidos aumentem a ambição de suas metas climáticas
domésticas".
Os planos ousados de Biden motivaram acusações de Trump e de conservadores
americanos, segundo os quais essa política ambiental será uma ameaça à
indústria americana e seus trabalhadores, aumentando, por exemplo, os custos da
energia no país.
RELAÇÕES COM BRASIL
A questão ambiental também deve ser um dos pontos centrais das relações entre
os EUA sob o governo Biden e o Brasil de Jair Bolsonaro. No primeiro debate
contra Trump, Biden fez críticas à política ambiental do republicano e as
estendeu ao presidente brasileiro.
Ao abordar os incêndios que devastaram parte da Costa Oeste dos EUA, Biden
mencionou também as recentes queimadas na Amazônia e no Pantanal e afirmou que
uma de suas propostas é trabalhar com países ao redor do mundo para atacar o
aquecimento global.
"A floresta tropical no Brasil está sendo destruída", criticou o
democrata, que prometeu se juntar a outros países e oferecer US$ 20 bilhões [R$
108 bilhões, na cotação atual] para ajudar na preservação da região.
"Parem de destruir a floresta e, se não fizerem isso, terão consequências
econômicas significativas", completou, indicando possíveis sanções ao
governo brasileiro.
Na ocasião, Bolsonaro classificou a declaração como lamentável. Aliado de
Trump, o presidente não escondeu sua preferência pelo republicano durante a
campanha e a apuração dos votos nos EUA.
Membros do Planalto, entretanto, pediram que
Bolsonaro agisse com cautela para não correr o risco de prejudicar as relações
entre os dois países se Biden fosse o vencedor.
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